Introdução
CD codificado com gerenciamento de direitos digitais
Em 2005, a Sony vendeu milhões de CDs de músicas "especiais" a consumidores que pensavam estar comprando CDs comuns. Quando as pessoas colocavam esses CDs no computador, o que acontecia muitas vezes era o equivalente a problemas causados pelo spyware: programas travavam, aplicativos ficavam lentos e uma série de arquivos ocultos mostravam ser praticamente impossíveis de ser instalados. Por que a Sony faria isso com seus clientes?
A resposta é: para proteger seus direitos autorais. A revolução digital que deu aos consumidores o poder de utilizar o conteúdo digital de formas novas e inovadoras também tornou quase impossível para os detentores de direitos autorais controlar a distribuição de seus produtos. Neste artigo vamos entrar no universo do gerenciamento de direitos digitais (DRM - Digital Rights Management). Veremos o que é o gerenciamento de direitos digitais, como os detentores de direitos autorais estão implementando o conceito e o que o futuro reserva para o controle de conteúdo digital.
Princípios básicos do gerenciamento de direitos digitais
O gerenciamento de direitos digitais engloba todo método de controle de acesso a materiais registrados utilizando meios tecnológicos. Basicamente, ele remove o controle de uso das mãos de uma pessoa em posse do conteúdo digital e passa-o aos cuidados de um programa de computador. Os aplicativos e os métodos são intermináveis e aqui vão apenas alguns exemplos:
* uma empresa configura seus servidores para bloquear o encaminhamento de e-mails;
* um servidor de e-book restringe o acesso à cópia e à impressão de material baseado nas restrições definidas pelo detentor do conteúdo, definido sob direitos autorais; (em inglês)
* um estúdio cinematográfico inclui um software em seus DVDs que limita a duas o número de cópias que um usuário pode fazer;
* um selo musical lança títulos em uma espécie de CD que inclui bits de informação destinados a confundir o software que transforma as músicas em formato digital.
Enquanto muitos consumidores acham que os métodos de gerenciamento de direitos digitais são excessivamente restritivos (especialmente aqueles empregados pelas indústrias cinematográfica e musical), esse gerenciamento tenta resolver um problema de legitimidade. A distribuição de conteúdo digital pela Internet via redes de compartilhamento de arquivos tornou as leis tradicionais de direitos autorais obsoletas, na prática. Toda vez que alguém baixa um arquivo MP3 de uma música com direitos autorais de uma rede de compartilhamento de arquivos em vez de comprar o CD, o selo musical que detém os direitos e os artistas que criaram a música perdem dinheiro. No caso da indústria musical, algumas pessoas estimam perdas de receita devido à distribuição ilegal do conteúdo de DVDs na faixa dos US$ 5 bilhões por ano. A natureza da Internet torna impraticável processar cada pessoa que quebra a lei dessa maneira, então as empresas estão tentando recuperar o controle de distribuição tornando tecnologicamente impossível de se fazer cópias digitais.
O problema é que, quando se compra um DVD, é perfeitamente natural que você queira fazer uma cópia para uso particular. Esse é o ponto principal da doutrina do uso legal na lei de direitos autorais. Existem certas situações que negam a proteção de direitos autorais em favor do usuário do conteúdo, incluindo a cópia de material protegido para o uso pessoal e a cópia de material de domínio público. A maior parte dos métodos de gerenciamento de direitos digitais não pode considerar o uso legal, já que um programa de computador não é capaz de tomar decisões subjetivas. Em 2005, uma corte francesa determinou que os DVDs codificados com gerenciamento de direitos digitais viola as leis de uso legal, pois o proprietário do DVD não consegue fazer uma cópia para seu uso pessoal.
Antes de seguirmos adiante com a controvérsia do gerenciamento de direitos digitais, vamos voltar um pouco e descobrir o que um método de gerenciamento de direitos digitais envolve do ponto de vista da programação.
Sistema de gerenciamento de direitos digitais
O sistema de gerenciamento de direitos digitais ideal é flexível, totalmente transparente ao usuário e consideravelmente complexo para ser administrado por um programa de computador. A primeira geração de softwares para esse fim buscava meramente o controle de cópias. A segunda geração busca controlar o que o usuário faz - assistir, copiar, imprimir alterar e tudo mais que seja possível fazer com o conteúdo digital.
Um método de gerenciamento de direitos digitais opera em três níveis: instituição de um direito autoral por um determinado conteúdo, gerenciamento de distribuição do conteúdo registrado e controle do que um consumidor pode fazer com o conteúdo, uma vez distribuído. Para atingir esse nível de controle, um programa de gerenciamento de direitos digitais tem de definir e descrever efetivamente três entidades - o usuário, o conteúdo e os direitos de uso - e a relação entre eles.
Linguagem de expressão de direitos
"Direitos" não é um conceito unânime no mundo da informática e programadores desenvolveram novas linguagens de computador para definir a idéia em termos digitais. Duas linguagens de expressão de direitos em uso hoje são a Linguagem de Expressão de Direitos MPEG (MPEG REL) e a Linguagem de Direitos Digitais Abertos (ODRL) (em inglês), ambas linguagens de computador baseadas em XML. A ODRL utiliza terminologias legais como "extrair", "instalar", "emprestar", "modificar", "rodar" e "vender". Ela também define restrições ("quantia fixa", "intervalo" e "alcance") e define pagamentos ("tipo taxa", "pré-pago" e "pós-pago").
Vamos utilizar um exemplo simples: um método de gerenciamento de direitos digitais para um site de download de MP3. Jane Doe faz o login em um site que ela assina para baixar "Everything is Everything", de Lauryn Hill. O nível de assinatura de Jane lhe garante cinco downloads por mês. Neste caso o usuário é "Jane Doe" e o conteúdo é "Everything is Everything" de Lauryn Hill. Identificar o usuário e o conteúdo é uma tarefa fácil. Jane provavelmente possui um número de cliente e cada arquivo MP3 no site provavelmente tem um número associado a ele. A parte mais difícil é identificar os direitos, ou seja, as maneiras pelas quais Jane pode ou não usar a música. Ela pode baixar a música ou já baixou cinco arquivos no mês? Ela pode fazer uma cópia ou ela está baixando um arquivo encriptado e uma chave correspondente? Ela pode extrair uma parte da música para usar no seu próprio programa de mixagem de músicas ou o arquivo é bloqueado? Os direitos de uso não englobam apenas permissões e restrições, mas também quaisquer obrigações relacionadas a transações. Por exemplo, Jane precisa pagar mais por esse download? Foi prometido a Jane um desconto se ela baixar essa música? Isso estaria incluído na relação entre ela, a música e os direitos.
Digamos que a Jane tenha feito apenas três downloads este mês, de forma que esse download está dentro da sua cota mensal. Suponhamos também que tenha recebido uma oferta especial de US$ 1 de desconto na taxa de assinatura do próximo mês se baixar essa música. Ela deveria poder copiar o arquivo sob o uso legal, mas talvez ela possa fazer apenas três cópias. E digamos que o detentor dos direitos autorais negue a qualquer pessoa o direito de extrair seu conteúdo digital. A estrutura de gerenciamento de direitos digitais para esse download vai parecer assim:
Exemplo de transação
Enquanto o usuário continua sendo o mesmo cada vez que Jane faz o login no site, a relação entre usuário, conteúdo e direitos pode mudar. O método de gerenciamento de direitos digitais deve ser capaz de se adaptar a condições que se alteram. Se Jane aumentar sua assinatura a um nível que permita downloads ilimitados em vez de apenas cinco por mês, o software de gerenciamento de direitos digitais precisa se ajustar a uma nova relação. O sistema de gerenciamento tem que estar em sintonia com a infra-estrutura dos sites para que possa ajustar a relação sem precisar parar. Essa é uma razão pela qual configurações de gerenciamento ininterruptas são difíceis de ser implementadas: sem padrões para seguir e uma gama de comandos não encontrada em nenhum outro programa de computador (veja o quadro "Linguagem de expressão de direitos"), um software de gerenciamento de direitos digitais não se adapta facilmente à arquitetura de comércio eletrônico existente. Ainda, discutivelmente a transação mais fácil de se controlar é um download. A parte difícil é controlar o que um usuário faz com o conteúdo digital uma vez baixado. Como site de download pode forçar o uso legal por parte da Jane? Como eles podem saber se ela só irá criar duas cópias do arquivo? É aí que o gerenciamento de direitos digitais fica preso.
Gerenciamento de direitos digitais automatizado
Empresas como a ContentGuard, a Digimarc, a InterTrust e a Macrovision vendem "soluções de gerenciamento de direitos digitais" automatizadas que incluem tudo que é preciso para configurar um sistema de gerenciamento. O completo pacote de gerenciamento da ContentGuard (em inglês) permite aos detentores dos direitos autorais criar e forçar licenças pelos seus produtos e serviços digitais, incluindo tudo, desde downloads de filmes até o software usado para o acesso online. O software RightExpress utiliza a linguagem de expressão de direitos MPEG REL e guia o detentor dos direitos por um processo de definição do conteúdo, usuário e usos legais. Ele pode determinar níveis de acesso e modos encriptados de conteúdo, criar uma interface personalizada que permite aos usuários obter conteúdo baseado nessa configuração, desenvolver um modelo de certificação do cumprimento da lei que verifica a identificação do usuário e localizar o uso do conteúdo.